domingo, 8 de setembro de 2013

Prisão de mulheres por tráfico de drogas cresce 84%, em cinco anos, em Santa Catarina

Mulher que gestou oitava filha no Presídio de Florianópolis fala sobre a dor da separação do bebê de um ano


Prisão de mulheres por tráfico de drogas cresce 84%, em cinco anos, em Santa Catarina Daniel Conzi/Agencia RBS
Marileia Barbosa, 38 anos, descobriu a oitava gravidez na prisão e foi escoltada até o hospital para dar à luzFoto: Daniel Conzi / Agencia RBS

As drogas estão levando mulheres a ter seus filhos na prisão. A conclusão de especialistas é comprovada em estatísticas nacionais. O número de detentas que cumprem pena nos regimes fechado e semiaberto ou em medida de segurança nos hospitais de custódia no Brasil cresceu 72% entre 2005 e 2012. Em Santa Catarina, subiu para 82%, no mesmo período.

Os dados são os mais recentes, de dezembro de 2012, divulgados pelos estados e organizados pelo
Ministério da Justiça. Roraima não consta da estatística porque não enviou os dados do período, de acordo com o MJ.

O encarceramento feminino é considerado um fenômeno no mundo ocidental e está diretamente relacionado ao tráfico de drogas. Entre as soluções, está a aplicação de penas alternativas para mulheres com bons antecedentes e sem vínculo com organizações criminosas.

A única lembrança que Marileia Barbosa, 38 anos, tem do pior dia de sua vida é de passar sua filha de um ano de idade para o colo da cunhada. A criança que ainda mamava balbuciou "pegá, pegá", mas a mãe não podia mais segurá-la nos braços.

A separação que a faz chorar quase todos os dias enquanto cumpre pena por tráfico de drogas no Presídio Feminino de Florianópolis ocorreu em maio passado. Marileia tem uma vida particularmente sofrida e características e experiências em comum com a massa carcerária feminina de Santa Catarina.

Ela nasceu pobre, filha de uma empregada doméstica alcoólatra e de um operário que morreu quando Marileia tinha seis anos. Aos oito anos, subia num banquinho para alcançar o fogão à lenha e cozinhar para os oito irmãos, na casa da família, no interior do Paraná. Na primeira vez em que fez arroz, levou uma surra da mãe porque o arroz ficou grudado na panela, cru e sem sal.

Marileia parou de estudar na 5a série para cuidar dos irmãos. Começou a usar drogas leves aos 14 anos, saiu de casa cedo, trabalhou como agricultora, prostituta e costureira. Nunca se profissionalizou nos mais de 20 anos que mora em Santa Catarina. Ficou viciada em crack aos 19 anos.

Em 2011, foi presa pelo mesmo crime que outras 637 mulheres, em Santa Catarina, em 2012: o tráfico de drogas. Em dezembro daquele ano, o total eram 1.154 mulheres encarceradas no Estado.

Até hoje, Marileia não entende porque foi condenada. Ela diz que foi presa com R$ 20 de maconha para uso próprio. Se resignou a cumprir a pena sem questionar porque não tem advogado.

Casos como a prisão de Marileia podem ser evitados se a Justiça passar a adotar penas alternativas à prisão, como prestação de serviços à comunidade. A grande maioria das mulheres condenadas pelo crime atuam no tráfico familiar e assumem a droga no lugar do marido. Poucas tem liderança.

Durante a plenária do 2º Encontro Nacional do Encarceramento Feminino, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, em Brasília, mês passado, magistrados, defensores e promotores públicos, estudiosos e membros da sociedade civil de todo o país apoiaram a adoção de penas alternativas.

A aplicação deste tipo de pena seria para mulheres usadas como "mulas" pelo narcotráfico ou vítimas da "coação moral irresistível" de maridos e familiares encarcerados para entrar com entorpecentes em unidades prisionais.

O grupo aprovou proposta ao Ministério da Justiça para que o órgão estenda o indulto (extinção da pena) às mulheres condenadas por tráfico privilegiado, ou seja, quando o traficante é réu primário, tem bons antecedentes e não se dedica a atividades criminosas nem integra organizações com esse fim.

Para o juiz auxiliar da Presidência do CNJ e coordenador científico do encontro, Luciano Losekann, as prisões por tráfico de drogas são as maiores responsáveis pelo aumento da população carcerária feminina.

Presente no evento, a socióloga Julita Lemgruber apontou o tráfico de drogas como responsável por 65% das prisões de mulheres brasileiras entre 2006 e 2011. A estudiosa defendeu a adoção de penas alternativas à de prisão, pois em muitos casos eram mulheres levando drogas para os maridos presos e não representavam perigo para a sociedade.

Participante do encontro do CNJ, a psicóloga e ex-diretora de cadeias femininas no Espírito Santo, com 18 anos de experiência na Secretaria de Justiça daquele Estado, Quésia Oliveira, as mulheres não são as protagonistas principais no tráfico de drogas.

— A maioria trafica para ajudar no sustento da família. É urgente rever a desproporcionalidade da punição que encarcera em massa mulheres pobres, mães solteiras, idosas em vulnerabilidade social, adolescentes sem perspectiva e propormos políticas públicas inclusivas e afirmativas — observou a especialista.

fonte: Diário Catarinense

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