Política criminal resulta em vidas despedaçadas de juventude pobre e negra, incluindo a feminina, diz especialista
Professora titular no Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina, pesquisadora do CNPq e Pós-Doutora em Criminologia e Direito Penal pela Universidade de Buenos Aires e pela Universidade Federal do Paraná, Vera Regina Pereira de Andrade coordena na Universidade Federal de Santa Catarina o projeto Universidade sem Muros.
Atualmente, o grupo de pesquisas atua junto ao Presídio Feminino de Florianópolis, com pres
tação de serviço jurídico às mulheres encarceradas e apoio às suas famílias. Confira a entrevista:
Diário Catarinense - Por que cada vez mais mulheres são presas em Santa Catarina?
Vera Regina - A expansão da criminalização e do encarceramento feminino é um fenômeno que pode ser observado no mundo ocidental , incluindo o Brasil e Santa Catarina e, sem dúvida, o detonador deste processo é o tráfico de drogas.
DC - Por que o tráfico de drogas está diretamente relacionado a este crescimento
Vera Regina - O tráfico é o principal detonador da expansão da criminalização feminina. Não significa que as mulheres tenham começado agora a cometer mais crimes, mas que elas estão, dependendo do estereótipo, mais vulneráveis à criminalização por este tipo de crime.
A criminalização das drogas é uma política criminal norte-americana substitutiva das políticas criminais dominantes durante a Guerra Fria, para a América Latina, como a política de segurança nacional vigente durante a ditadura militar.
O traficante é o substituto político do comunista e, apesar desta política não ser nossa, ela colonizou a América Latina e estamos pagando por ela com as vidas despedaçadas da nossa juventude pobre e negra, incluindo a feminina. As drogas estão levando as mulheres para parir seus filhos na prisão.
DC - Quais as soluções para reduzir o número de mulheres presas no Estado?
Vera Regina - As "soluções" tem a ver com a lógica do encarceramento e se o núcleo do encarceramento reside na criminalização do tráfico, o caminho passa pela descriminalização do tráfico. Mas como não se trata de mera lógica, o processo é complexo.
Envolve dimensões estruturais e institucionais (no atual estágio do capitalismo globalizado sob a ideologia neoliberal a criminalização do tráfico cumpre funções políticas e político-criminais de controle e exclusão social muito nítidas).
Dimensões culturais e simbólicas ( a ideologia dos operadores do sistema penal e do senso comum é a de que combatendo o tráfico estão defendendo a sociedade - ideologia da defesa social - porque a guerra às drogas é uma política que obteve, com sucesso, a demonização do e da traficante como os inimigos número 1 da sociedade, o que deixa intocadas as estruturas que constroem o demônio como tal).
Em suma, é uma luta ideológica muito difícil de vencer, porque tem a seu favor o império midiático.
DC - O que acha do ambiente carcerário para mulheres em SC?
Vera Regina - Não posso responder esta pergunta genericamente porque não detenho o conhecimento empírico, mas, regra geral, o ambiente carcerário é dramático, agravado pela especificidade de gênero e pelas específicas necessidades reais das mulheres, notadamente em relação aos filhos nascidos na prisão e à revista íntima de que são vítimas as mulheres visitantes de familiares presas.
fonte: Diário Catarinense

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